Hojemacau|6 Fev 2013
Ho Wai Tim foi o último presidente conhecido da Associação de Ciência Política e Direito de Macau (ACPDM), no entanto, ao Hoje Macau diz já não estar à frente dos destinos da mesma há mais de seis anos. Uma carta dirigida ao Gabinete para a Reforma Jurídica, que data de 2008, sugere o contrário. Nessa mesma carta, é revelado o contacto telefónico e morada da ACPDM que coincide com o endereço de Ho Wai Tim, que diz nunca ter alterado por ser uma pessoa “disponível” e “fácil de encontrar”
O Hoje Macau contactou o presumível dirigente da Associação de Ciência Política e Direito de Macau (ACPDM), Ho Wai Tim, de forma a compreender melhor a posição da associação que pediu para ser publicado, na passada sexta-feira, um anúncio, em género de carta, cujo o título é “Instalações militares com forte poder colonial devem ser demolidas”. O mesmo mostrou-se disponível ao contacto deste jornal, deixando claro, no entanto, que já não estava associado à direcção da ACPDM. “Já não sou presidente da ACPDM há seis ou sete anos embora a minha saída não tenha sido oficializada”, revela ao Hoje Macau. Questionado sobre quem é o actual dirigente, escusou-se a avançar o nome ou o contacto da entidade, sobretudo “numa época tão sensível”, dizendo apenas que os elementos da associação “são todos académicos e só às vezes se reúnem para discutir as opiniões”.
No entanto, deixou expressa a sua opinião sobre toda a polémica que envolve a organização. “A sociedade precisa de opiniões diversas, não deve fazer circular sempre a mesma, isso está intimamente relacionado com a liberdade de expressão”, revela. Questionado sobre o facto dessa mesma liberdade de expressão precisar de ser paga num jornal de língua chinesa, Ho Wai Tim não vê qualquer contradição. “Se o jornal não escreveu [o manifesto] que a associação quis veicular, tem de pagar a publicidade para garantir que o texto é divulgado”, observa. Em seu entender, os ânimos exaltaram-se em praça pública, levando a que alguns comentários “fortes” fossem veiculados na Internet, “exigindo, por exemplo, o fim da ACPDM apenas porque lançou uma opinião no jornal”.
No domingo, o “ex-dirigente” falou ao Jornal do Cidadão expressando ainda a sua opinião sobre o terreno, junto à Rua de Entrecampos, em Coloane, onde se situa a Fortificação Militar Portuguesa. Segundo opinião veiculada ao diário de língua chinesa, “o terreno terá de ser desenvolvido um dia, por isso espera que o proprietário possa discutir activamente a protecção ambiental com as associações ambientais”. Ho Wai Tim é actualmente, segundo confirmou, dirigente da Associação de Ecologia de Macau.
O Hoje Macau procurou contactar directamente a ACPDM – que não tem um
sítio online na Internet -, através de um contacto publicado numa carta
dirigida ao Gabinete para a Reforma Jurídica do Direito Internacional em
2008 pelo presidente da associação e assinada por Ho Wai Tim. Ou seja,
alegadamente depois de terminado o seu mandato. Na mesma carta, consta
um contacto telefónico e uma morada que, segundo Choi Chi Chio,
assistente da Associação Novo Macau, corresponde ao seu endereço de
casa, tal como veiculou no seu Facebook. “Fomos para a morada que
constava da carta, descobrimos que era a casa do senhor Ho. Se já deixou
de ser presidente, porque é que a morada da associação ainda é a casa
dele? Será verdade que já não tem nada a ver com a associação?”
Contactado novamente pelo Hoje Macau, Ho Wai Tim mostrou-se disponível
para responder às interrogações que surgiram: “Efectivamente não me
recordo porque a carta de 2008 tem o meu nome. Desde 2006 já não
trabalho para a ACPDM”, explicou. “Desde que me tornei presidente da
Associação Ecológica de Macau, em 2010, não me envolvi em mais assuntos
da antiga associação”, adiantou. Quanto à morada, revela sem
preocupações que “se tornou mais prático” usar a sua morada como sede da
ACPDM, bem como a de outras associações. “Nunca mudei por
auto-recreação a morada da associação porque sou uma pessoa disponível e
fácil de encontrar”, revela sem hesitações.
Demolir o forte igual a boicotar o património
A carta, publicitada no jornal Ou Mun, que entretanto gerou polémica
nos meios de comunicação chineses e portugueses, veiculava uma posição
controversa sobre a Fortificação Militar Portuguesa, como símbolo de
“poder colonialista”. O Hoje Macau procurou saber a posição da
Associação dos Embaixadores do Património de Macau, na voz do seu
presidente, Derrick Tam Chi Kuong, que contra-argumenta a opinião
veicula no manifesto. “O forte é um edifício independente que não está
relacionada com o poder colonial, também acho que não faz sentido que
cada edifício de matriz colonial tem de ser removido. A reserva do
património é para mostrar o significado daquela época, se deitarem
abaixo este, muitos outros edifícios em Macau teriam de ser demolidos.
Nesse caso deixaria de fazer sentido o facto do Centro Histórico de
Macau estar incluído na Lista do Património Mundial [da UNESCO], já que
[a sua mais-valia é] representar a fusão da cultura oriental como a
ocidental”, avalia. No entanto, ressalva, todas as associações têm
direito a expressar a sua opinião e, caso o Governo julgue por bem
preservar a casamata, “pode ouvir as opiniões das associações e
especialistas para decidir como tratar o caso”.
Apesar da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes
(DSSOPT) não ter recebido qualquer indicação sobre um projecto de
desenvolvimento de um edifício de 100 metros no terreno onde fica a
fortificação, possibilidade que levou à oposição de alguns populares e
tribunos, Tam Chi Kuong explica que é uma solução em aberto, já que está
no direito do proprietário. “Mas se o posto militar tiver valor
[patrimonial ou histórico] e o Governo pensa que vale a pena preservar,
pode discutir com o proprietário uma solução de comum interesse”,
ressalva. Sobre a mesma questão, Chan Su Weng, da Associação de História
de Macau, já tinha comentado ao Jornal do Cidadão no sábado, não
entender como o terreno em Coloane deixou de ser público para passar a
ser privado, pedindo ao Governo que publique dados sobre o processo de
concessão da terra.
Também em seu entender, “há 40 anos o governador português de então
definiu Coloane como zona de protecção natural [que hoje consta
inclusivamente da Lista do Património do Governo], pelo que não é
possível construir prédios altos, nem fazer construções que danifiquem a
montanha (…) Portanto, recomendo a preservação da fortificação.”
Além do mais, Chan Su Weng, que foi também vice-editor do jornal Ou
Mun, tinha veiculado uma posição pró-edifício de matriz colonial, no
qual foi implicado o Clube Militar de Macau. “Então o Clube Militar ou o
túnel militar da Guia [refugio aéreo] também têm que ser demolidos? E
as ruas com nomes dos ex-governadores portugueses em Macau, também se
removem? Por essa razão, é necessário fazer uma actualização da lista do
património, e ao mesmo tempo, não se deve deixar o caso ficar tão
político”, indica.
Governo defende Clube Militar O Clube Militar de Macau é um edifício
classificado como de “interesse arquitectónico” e, por isso, protegido,
não podendo ser demolido, referiu o Instituto Cultural de Macau, em
resposta escrita à agência Lusa. “Consideramos que Macau é uma sociedade
aberta, multicultural e tolerante, na qual diferentes pessoas expressam
diferentes opiniões”, responde à Lusa sobre a preservação destes e
outros edifícios que integram o património de Macau.”Iremos continuar
atentos aos trabalhos de protecção do património. Relativamente à
Fortificação Militar Portuguesa de Coloane, já ouvimos diferentes vozes e
opiniões, já destacámos pessoal para conduzir uma inspecção ao local e
iremos agir de acordo com as nossas atribuições”, refere também a nota
do Instituto Cultural, sem especificar se o edifício está classificado
de alguma forma para que seja protegido. O Hoje Macau tentou obter uma
reacção do presidente do Clube Militar, Ambrose So, o que não foi
possível por não se encontrar no território.
Reacções
“É um total disparate, numa altura em que estamos em plena RAEM. Como
todos nós sabemos, a essência da RAEM é a existência de um segundo
sistema. Não se sabe o que é que esta associação pretende e pouco se
sabe sobre quem está por detrás destas associação” – Miguel Senna
Fernandes, presidente da Associação dos Macaenses (ADM), à Rádio Macau
“Pela lógica, seria necessário acabar com tudo o que vem do passado, incluindo a Lei Básica.” Idem
“Isto faz parte da nossa história. Os edifícios reflectem a história
e, além disso, a cultura. São um património cultural. E devem estar
aqui.” Larry So, politólogo, à Rádio Macau
“Todas as igrejas em Macau também deveriam ser demolidas, porque, na
verdade, foram o primeiro tipo de edifícios a serem estabelecidos em
todas as colónias, portuguesas ou inglesas. Todos estes edifícios que
restaram reflectem o nosso passado e a nossa história, e não acho que
devem ser demolidos”. Idem