CENTRO EDUCATIVO GERA EXPECTATIVAS DE DEBATE SOBRE PATRIMÓNIO


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Um dos bens imóveis classificados que se situa perto da praça do Tap Seac poderá vir a ser transformado num centro educativo sobre recursos do património. Um espaço de debate com áreas para formação e actividades educativas são algumas das sugestões de especialistas ouvidos pela TRIBUNA DE MACAU. Já o arquitecto Vizeu Pinheiro considera que estes edifícios devem ser preservados de forma a manter a sua “identidade”

 

Catarina Pereira*

 

A Planta de Condições Urbanísticas (PCU) relativa a um dos edifícios que integra o conjunto de bens imóveis situado na Avenida do Conselheiro Ferreira de Almeida está sujeita à recolha de opiniões até dia 22, pelo que o plano poderá ainda sofrer alterações. A ideia é transformar o edifício num “centro educativo sobre recursos do património”, confirmou o Instituto Cultural (IC) a este jornal.

Contudo, não se sabe ao certo qual a finalidade do centro, nem o público-alvo. Ainda assim, a TRIBUNA DE MACAU ouviu especialistas da área no sentido de perceber se faz sentido a criação deste espaço. Se há quem considere que a ideia é um passo para o conhecimento do património cultural, há quem defenda que a arquitectura e funções desses edifícios no passado devem ser preservadas.

O arquitecto Rui Leão acredita que, se o centro não for apenas “só de informação” poderá ser uma mais-valia. Na sua opinião, fará sentido se for uma plataforma de debate onde especialistas possam transmitir conhecimentos à população em geral. “O que faz falta em Macau nesta área e noutras é haver plataformas de debate”, acrescentou.

“Se for um espaço de debate onde profissionais, arquitectos e pessoas ligadas à conservação, e outros que estejam interessados, possam ter um papel nessa interface com a população mais alargada então isso será de grande utilidade para as questões ligadas ao património e às especificidades das políticas”, clarificou o arquitecto.

Por outro lado, “se for só uma coisa rígida, só de informação sem interacção não vejo onde possa contribuir”, disse Rui Leão, advertindo que, nesse caso, não haverá qualquer processo de aprendizagem nem partilha de conhecimento. “Quando não há interacção, não se consegue cativar nem alargar de uma forma séria o conhecimento à população”, concluiu.

“Um bom conceito”, é assim que o presidente da Associação dos Embaixadores do Património de Macau classifica a ideia. “Macau tem falta de espaços dedicados exclusivamente à divulgação e à educação sobre património. O projecto irá beneficiar o desenvolvimento da educação sobre património a longo prazo. Acredito que o efeito do centro educativo só irá surgir com a passagem de alguns anos”, afirmou Wallace Kwah.

“Sugiro que, se os procedimentos forem permitidos, o Governo colabore com associações para que aproveitem o centro como forma de divulgação de conhecimentos sobre o património de Macau, não necessariamente através de arrendamento de espaço. Sobre as formas de utilização do centro, acho que o Governo pode consultar a opinião do sector”, afirmou.

 

Das acções de formação à preservação do passado

A associação, que se tem dedicado à formação de jovens embaixadores do património, forma por ano entre 30 a 70 jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 29 anos. Segundo Wallace Kwah, o espaço físico é um dos problemas com o qual a associação se tem defrontado. “É difícil arrendar espaços de área suficientemente grande. Por isso, penso que é importante ter um espaço fixo e grande para acolher aulas de formação e actividades de divulgação sobre património”, referiu.

Apesar de acreditar que actualmente a população tem “muitos canais” de acesso ao conhecimento sobre o tema, como estudos académicos ou os livros lançados pela Associação para a Reivindicação de Estudos do Património Cultural de Macau, Wallace Kwah disse ser “um desperdício” deixar o espaço “abandonado e sem qualquer utilização”.

Quanto à localização, considera-a adequada uma vez que “é perto do IC e assim será fácil o Governo gerir o espaço. Depois, há muitas construções patrimoniais nas imediações, o que ajudará as pessoas a perceber realmente que o património cultural é uma coisa próxima do dia-a-dia e não um conceito longínquo”, concluiu Kwah Hou In.

Penny Wan, professora do Instituto de Formação Turística (IFT), considera que seria “uma óptima ideia” a utilização do edifício para um princípio educativo, ainda para mais quando se relaciona com o património. “Acho uma óptima ideia [criar] um centro de educação sobre património, porque as pessoas precisam de saber mais sobre o nosso património e cultura e perceber a nossa história e o seu significado, este tipo de informação”, disse. Contudo frisou que “não tem de se mudar tremendamente o edifício, podemos adaptá-lo a este propósito”.

De acordo com a PCU em causa, a obra deve respeitar o parecer vinculativo do IC no que concerne à altura do edifício, sendo que a fachada deve continuar a ser preservada e as características ambientais respeitadas, uma vez que o lote está sujeito ao disposto na Lei de Salvaguarda do Património Cultural.

Caso o plano do centro se concretize, Penny Wan acredita que deve haver “boa informação relativamente à sua localização”. Além disso, acrescentou, “o centro deve ter uma biblioteca para os investigadores, com versões de livros em Chinês, Português e Inglês, para que possam fazer pesquisa e um museu interactivo com diversas informações sobre a arte e história da cidade, por exemplo”. Penny Wan sugere ainda a criação de um auditório, “no caso de querermos contactar investigadores para apresentarem trabalhos da área aos alunos da universidade, por exemplo”, “várias salas onde o público possa organizar “workshops” relacionados com o património” e ainda uma cafetaria.

 

Vizeu Pinheiro questiona localização

Por outro lado, o arquitecto Francisco Vizeu Pinheiro olha para o plano com uma perspectiva diferente. “Não sei se o edifício será o melhor para criar este tipo de centro, porque esses edifícios foram habitações de oficiais do Governo, que eram na sua maioria de famílias macaenses, por isso creio que se deve manter viva essa memória”, afirmou. Recuperar alguns edifícios é algo que deve ser feito, mas neste caso deveria ter como finalidade preservar a “função que tiveram no passado”, de modo a manter a identidade e valor social e histórico dos edifícios. Além disso, acrescentou, os edifícios “são um bocado pequenos”, pelo que “deveria ser feito numa área maior”.

Assim, o edifício deveria ter como finalidade a conservação da tradição da arquitectura. Se o centro vier a ser criado, seria uma mais-valia “ter especialistas que pudessem ajudar a fazer manutenção de edifícios antigos, como por exemplo as igrejas” ou “ajudar na preservação da arquitectura chinesa, porque há muitas estruturas em madeira”, concluiu Francisco Vizeu Pinheiro.

 

* Com Rima Cui

 New Sources: Jornal Tribuna de Macau



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